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sábado, 14 de agosto de 2010

SE, POR UM ACASO, O RELÓGIO ADIANTOU

Mais um dia. Talvez atrasada demais para me lembrar do meu sonho, mas pude senti-lo, não pude deixar para depois, para se esquecer como se esquece de um velho livro de receitas.
Havia uma criança sentada em uma cadeira, tentando se lembrar da face dos pais, horrorizada por ter visto a violência arrancar-lhes a vida. Por conta de uma guerra - que não se diz guerra, mas eu digo pela falta de paz-, pais se retiraram do caminho. Estava sozinha, apoiava os cotovelos numa mesa redonda, sob uma faca. De onde estava podia ver uma porta, talvez uma oportunidade. Faria uma escolha. Parou. Pensou. Os olhos se fixaram. Sentiu o abraço da mãe e o colo do pai. Havia feito sua escolha: a dor se estenderia por algunsminutos. Não se arrependeu. Ainda estava viva, mas que motivo teria para estar?
Meu trabalho me esperava, eu estava saudável demais para ele, porém, se não me permitisse minutos de comoção, de reflexão, estaria, então, doente demais para viver.
Eu bem poderia dizer: que sonho ridículo! Não tenho escolha! A vida não para!
Estaria eu me acovardando, culpando a vida porter escolhido, não poder viver por mim.
Sei que você, caro leitor, pode estar ocupado demais para deixar-se comover, para pensar nesse mundo tão cinza, triste, falso e banal, mas um dia o mundo pode parar e você talvez, nesse dia, não consiga mais pensar.
Portanto, não se esqueça do meu sonho, assim como se esquece de um velho livro de receitas, pois, qualquer dia desses, se, por um acaso, o relógio adiantar e você tiver cinco minutos para se lembrar do que lhe propus, talvez você também ganhe alguns motivos para sonhar, ou para fazer suas escolhas, por você mesmo. Dessa forma, talvez o mundo não morra assim, aos poucos. Enfim, meu leitor, espero que todas as manhãs possamos ter coragem de mudar o câncer de lugar, de tentar nos curar, de deixar-nos comover
com sonhos sem razão, porém com uma grande motivação para melhor viver.

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